THIAGO
DE MELO E LÚCIO COSTA
DOCE HUMANISTA
Thiago de Mello
Tive a alegria, que nunca se acabou, de conhecer Lúcio Costa no
começo dos anos 50. Fui (tomei coragem) levar meus poemas ao Carlos Drummond de
Andrade, a quem também ainda não conhecia, lá no 9º andar do Ministério da
Educação, no Rio de Janeiro. Drummond leu meus versos, disse que eu havia
nascido com a tara, conversamos sobre o Amazonas e, no instante da despedida, o
poeta me levou a um canto da sala e me apresentou a um cidadão de bigodes
severos e sorriso meigo, seu companheiro de trabalho no Serviço de Patrimônio
Histórico Nacional, criado e dirigido por Rodrigo M. F. de Andrade. Era Lucio
Costa, a quem eu conhecia só de nome e já de fama: lera mais de uma vez o seu
nome gravado numa coluna do Ministério entre os criadores do edifício.
Ao estender a mão para me despedir do homem famoso, ele simplesmente
disse: ‘‘Não, senhor. Faço questão de acompanhá-lo ao elevador!’’ Não ficou na
porta do elevador. Desceu comigo e simplesmente me disse que queria ler os meus
poemas, que me desse autorização para pedi-los ao Drummond. Pois foi assim: num
só dia conheci duas pessoas que passaram a fazer parte de minha vida, na qual
tiveram a maior importância.
Foi convivência de quase meio século. Falávamos muito mais da vida
do que da arte. Da vida do homem neste país e neste lindo e degradado lugar
chamado Terra. Quando passei a visitá-lo com mais freqüência em sua casa do
Leblon, Lúcio comentava os fatos do dia, divulgados pela televisão. O meu amigo
padecia de indignidade moral contra tudo que fere a beleza da dignidade humana.
Lucio escrevia como um príncipe. Não era só um dos grandes
arquitetos e urbanistas do século. Era um poderoso humanista. E um escritor de
primeira água. Basta ler os textos que escreveu quando nomeado diretor da
Escola de Belas Artes, os seus ensaios sobre arquitetura brasileira (um deles
traduzi e publiquei no Chile quando fui adido cultural naquele país). O livro
que nos deixou, sobre sua vida e sua obra, é desses que nenhuma pessoa que se
pretenda culta pode deixar de ler. É uma luminosa lição.
Gostava e pedia que eu lhe dissesse poemas, em voz alta. Falava da
qualidade musical e do ‘‘timbre intimista’’ de minha voz. Durante os anos em
que escreveu sua autobiografia, eu lia para ele trechos que ele acabara de
escrever. Estar com Lúcio, ouvir a sua voz cheia de sabedoria e de doçura, foi
uma das grandes bênçãos de minha vida. Ficou feliz quando lhe disse que Joaquim
Cardozo, só conhecido como engenheiro-calculista, era um de meus poetas
prediletos. Era também o dele.
Quando voltei do exílio e saí da cadeia, disse, em entrevista
coletiva, que ia viver na minha floresta, que queria ter minha casa lá. Uns
três dias depois, Lúcio me chamou e disse ‘‘Venha buscar a sua casa porque ela
já está pronta’’. Um dia, levei a ele fotos da casa em construção. Ele me
agradeceu tão efusivamente como se fosse um principiante vendo seu primeiro
projeto em execução.Eu é que deveria agradecê-lo. Nunca teria dinheiro para
pagar à altura um projeto de Lúcio Costa. Divulgada em reportagens em
reportagens pela imprensa ou em revistas especializadas, nacionais ou
estrangeiras, é considerada uma bela obra-prima.
Depois Lúcio projetou uma segunda casa, que
construí num lugar mais silencioso, na beira do rio
Andirá; e um pavilhão que termina por uma torre, para abrigar biblioteca
e museu. Em toda a Amazônia são os únicos projetos de Lúcio desenhados e
edificados.
Era a pessoa mais delicada que já conheci. Era a delicadeza em toda
a sua riqueza e profundidade. O respeito que tinha por si próprio e pelo seu
trabalho lhe advinha do superior respeito pelo ser humano. Por toda e qualquer
pessoa que conhecia.
Matéria exclusiva da Revista CASA CLÁUDIA DE 98 sobre a obra de Lúcio Costa no Amazonas.
A CASA DE THIAGO DE MELO
Situação de como está a residência de Thiago de Melo, atualmente ele não mora mais na casa, e seu aspecto de abandono é preocupante. Há alguns anos, pesquisadores e museólogos tentaram fazer um projeto para tornar a casa um museu, a Casa de Leitura Thiago de Melo, mas parece que essa intenção foi transferida para Manaus, onde está sendo implantada na área do Porto, no prédio do antigo Tesouro Público.
Bicicletas em Barreirinha
A equipe da expedição da revista Casa Cláudia quando desembarcou em Barreirinha, se deparou com uma cena inesperada, onde encontraram uma cidade onde praticamente não tinha automóvel, e todos na cidade utilizavam a bicicleta como meio de transporte.
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