Por: Camila Montagner
O que é? Você certamente já ouviu uma grande obra viária ser justificada porque fará com que o trânsito flua melhor com mais pistas, mais avenidas, mais pontes. Uma relatório feito com base em anos de estudo divulgado pelo departamento de transporte da Califórnia mostra que a expansão viária quase sempre causa aumento no tráfego de veículos. Aqui no Brasil, a ampliação da Marginal Tietê, inaugurada em 2010, é um exemplo de ampliação viária que prometia fluidez e piorou o índice de congestionamento, que chegou a quase dobrar.
Se você construir, ele virá
Em uma análise simplificada, um congestionamento é sinal de que há mais carros circulando do que espaço nas ruas para acomodá-los adequadamente. Uma forma intuitiva de diminuir esse problema é aumentar a oferta de vias, até o ponto de atender à demanda dos automóveis. Faz sentido na teoria, mas o resultado não é tão simples assim.
Na última semana, a Caltrans (empresa que gerencia o trânsito da Califórnia), divulgou um relatório que apresenta evidências de que grandes obras viárias não são a melhor solução para o trânsito. Isso se deve ao efeito chamado de “demanda induzida”, que é o aumento acima do esperado de veículos circulando em locais onde a capacidade de tráfego da via foi ampliada. As novas vias motivam mais motoristas a pegarem o carro com mais frequência, leva para a recém-inaugurado asfalto carros que faziam outros trajetos e motiva adeptos de outros modais e até mesmo caroneiros a dirigir.
Estender, alargar e implantar vias diminui os “pontos negativos” dos trajetos de carro para um indivíduo que está decidindo qual meio de transporte adotar. Segundo a pesquisa californiana, um aumento de 10% na capacidade das vias tende a aumentar entre 3 e 6% as milhas automotivas percorridas a curto prazo e entre 6 e 10% a longo prazo. O estudo também considera que aumentar a capacidade de tráfego intensifica o uso do carro não só onde houve ampliação, indicando que motoristas trocaram uma via por outra, mas em toda a malha viária. Consequentemente, há aumentos significativos na emissão de gases poluentes. Além da expansão viária, a pesquisa também levou em conta fatores demográficos, aumento da renda, mudanças no serviço de tráfego e crescimento populacional.
Esses números ganham força porque não estão isolados. Vários outros estudos, realizados em outros países, identificaram a mesma dinâmica. Mesmo no Brasil. Segundo dados da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) divulgados março de 2015, cinco anos após a inauguração da terceira posta da Marginal Tietê, a lentidão média em dias úteis subiu até 80% na via. O governo do Estado gastou R$ 1,5 bilhão na obra que resultou em redução do volume de congestionamentos nas pistas durante os primeiros três anos após sua conclusão. Porém, em 2014, a lentidão média no horário de pico da tarde, que era de 19,8 km em 2010, subiu para 35,7 km.
Os engarrafamentos na cidade como um todo também pioraram, sendo que no ano passado a média de quilômetros de lentidão foi 22% maior que a de 2010. A promessa era que a obra tornaria São Paulo mais fluida, e muita gente foi atraída a voltar, começar a usar ou pegar o carro com mais frequência. Se considerarmos o aumento da frota de veículos no período, em 2010 o número de carros circulando na capital paulista era de 6.791.128, segundo dados do Detran-SP. Em abril de 2015, havia 7,98 milhões de veículos na maior cidade do Brasil, ou seja, desde a inauguração da expansão da marginal a frota passou por um aumento de 17,5%.
Se aumentar a malha viária não faz o trânsito fluir melhor, o que acontece se diminuirmos a malha viária? Segundo o mesmo relatório californiano, reduzir a capacidade de abrigar tráfego motorizado tende a produzir benefícios econômicos e sociais sem aumentar os congestionamentos. A desativação de elevados combinada com a melhoria de avenidas no nível do terreno em São Francisco, por exemplo, contribuiu para a revitalização de áreas degradadas da cidade e produziu uma queda significativa no tráfego. O que reforça a frase de Jaime Lerner, ex-prefeito de Curitiba, quando perguntado porque seus planos viários não incluíam pontes: “uma ponte é o menor caminho entre dois congestionamentos”.
Pode até ser o ponto de partida para um estudo sobre a desativação do Minhocão, mas isso já é outra história.
Fonte: Outra Cidade
Fonte: Outra Cidade
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